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quarta-feira, 29 de junho de 2011

'União Pão de Açúcar-Carrefour derruba um saudável equilíbrio'


Carlos Eduardo Severini, presidente da associação de atacadistas, fala em perdas para o pequeno varejo se operação for adiante

A proposta de união entre o Pão de Açúcar e o Carrefour, se efetivada, deve criar o terceiro maior varejista de alimentos do mundo. Se há quem ganhe com a operação, há também seus mártires - e nesse grupo tendem a figurar atacadistas e varejistas de baixo poder de fogo, segundo Carlos Eduardo Severini, presidente da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores de Produtos Industrializados (Abad). "Hoje, observamos no Brasil um saudável equilíbrio na cadeia de abastecimento", afirma o dirigente, que faz a ressalva: "a quebra desse equilíbrio tende a afetar principalmente o pequeno e médio varejo independente, que abastece as classes C, D e E".

Leia a seguir a entrevista de Severini ao iG:

iG: O que muda para atacadistas e distribuidores se a fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour se concretizar?
Carlos Eduardo Severini: O negócio em questão geraria uma inédita e importante concentração do mercado varejista brasileiro ao unir as duas maiores redes em operação no País. Hoje, observamos no Brasil um saudável equilíbrio na cadeia de abastecimento. A quebra desse equilíbrio tende a afetar principalmente o pequeno e médio varejo independente. Isso é preocupante porque o varejo independente é um grande gerador de empregos e é o principal responsável pelo abastecimento das populações das classes C, D e E em todo o País.

iG: Somadas, as duas redes não têm uma concentração muito grande em todo o país de forma homogênea (há Estados em que elas sequer têm lojas), mas isso acontece especialmente em São Paulo. Estaria no mercado paulista um eventual empecilho para a concretização do negócio?
Severini: Sim, mas os maiores empecilhos são de outra ordem. A rigor, o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica, órgão antitruste ligado ao Ministério da Justiça] não poderia aprovar essa fusão. O Casino [atual sócio do Pão de Açúcar, com o qual está em litígio] dificilmente vai facilitar as coisas e a injeção de dinheiro pelo BNDES também me parece problemática.

iG: O que acontece com o cotidiano de atacadistas e distribuidores em uma operação como essa pretendida por Carrefour e Pão de Açúcar? O grupo chileno Ceconsud, por exemplo, que já era dono do GBarbosa, comprou o Bretas em 2010. O que mudou no cotidiano das associadas da Abad depois dessa operação?
Severini: Tendo em vista a importância econômica e social do pequeno e médio varejo independente, caso essa aquisição realmente ocorra, julgamos importante promover ações que valorizem e beneficiem esse pequeno varejo gerador de emprego. O Ceconsud não se compara ao presente caso. Além de GBarbosa e Bretas atuarem em áreas geográficas diferentes, sua participação no mercado não é muito significativa.

iG: Para distribuidores e atacadistas, quais os pontos negativos e positivos dessa operação?
Severini: A Abad acredita que a concentração de mercado nas mãos de poucas empresas não é benéfica para indústria, o pequeno e médio varejo, os agentes de distribuição e o próprio consumidor.

iG: O que muda nas bases de negociação entre atacadistas e varejistas?

Severini: Uma grande concentração certamente gera um grande poder de barganha com o fornecedor, beneficiando as grandes redes. Contudo, as bases de negociação do atacado com o pequeno e médio varejo, sua principal clientela, não deverá ser alterado. Até porque o segmento representado pela Abad apoia a indústria, o equilíbrio na cadeia de abastecimento, o pequeno e médio varejo e o que ele representa em termos de geração de empregos locais e capacidade de abastecimento das regiões mais distantes.

iG: Operações desse porte podem representar o fechamento de atacadistas e distribuidores?
Severini: A capacidade do segmento de adaptar-se às condições do mercado vem sendo comprovada ao longo dos anos. Creio que dificilmente ocorreria esse fechamento, pelo menos em grande escala.

iG: E operações desse porte no varejo de alguma forma estimulam fusões também entre atacadistas? Há algum sinal de que isso possa vir a ocorrer?

Severini: É cedo para fazer esse tipo de análise, não temos dados.

Patrick Cruz, iG São Paulo

E nós com isso?


Nós, os leigos, que fazemos compras em supermercados, pagamos a mais alta taxa de juros do planeta e morremos em impostos extorsivos, precisamos saber --e entender-- o que afinal o BNDES pretende ao liberar R$ 4 bilhões para o empresário Abílio Diniz, do Pão de Açúcar, comprar o Carrefour.

Será que é para baratear os preços de verduras, frutas, arroz, feijão, carne, produtos de higiene, material de limpeza e eletrodomésticos, por exemplo?

Improvável, pois, com o Carrefour e o Pão de Açúcar juntos, não há concorrência. Você aí acha que eles vão ajustar seus preços pelo menor ou pelo maior? Dá um chute. Pelo óbvio, tudo deve ficar mais caro.

Será, então, que os fornecedores vão ter melhores chances de barganha para seus produtos?

Improvável, pois os dois gigantes, unidos, vão poder pintar e bordar, além de impor seus valores a seu bel prazer. De novo, questão de mercado e competição, ou de não competição.

Ah! Então é porque a fusão vai gerar empregos no país inteiro?

Improvável. Ao contrário, aliás. Quando houver uma loja do Carrefour ao lado de outra do Pão de Açúcar, é mais do que razoável imaginar que uma das duas vá fechar. E os empregados vão dançar --no olho da rua.

Enfim, essa operação toda precisa ficar devidamente clara, à luz do dia. Até porque o BNDES, que é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, deve explicações ao excelentíssimo público sobre como está empregando os recursos com vistas --veja bem-- ao desenvolvimento tanto econômico quanto social. A fusão se encaixa aí?

A graninha boa que o BNDES está despejando corresponde a 85% do capital para concretizar o negócio, e o super-gigante resultante dos dois gigantes terá nada mais nada menos que 32% do varejo nacional.

Agora é que nós, os leigos, vamos ver se o Cade é mesmo para valer. No mínimo, queremos respostas para entender tudo direitinho, certo? Até porque, no final, nós é que vamos pagar a conta.

Por Eliane Cantanhêde da Folha de S. Paulo